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Após cometer corrupção passiva e abuso de autoridade, juiz é punido com aposentadoria

18/09/2016 - 12h46
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O Pleno do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) decidiu na sexta-feira (16), de aposentar compulsoriamente, por mais uma vez, o juiz – já aposentado por outras infrações –  Sérgio Rocha Pinheiro Heathrow, pelos crimes de corrupção passiva e abuso de autoridade. O caso contra o magistrado foi relatado pela desembargadora Cynthia Resende, corregedora das Comarcas do Interior. O juiz foi acusado de solicitar vantagem financeira indevida a uma servidora, com o falso argumento de que sua noiva, na época, estava grávida de cinco meses e estava com problemas de saúde, com risco de perder o bebê. Ele ainda foi acusado por determinar o cancelamento de matrículas de imóveis da cidade de Coribe, no oeste baiano, e por proferir uma decisão liminar em uma ação de usucapião. Segundo Cynthia Resende, Sérgio Heathrow determinou a cancela das matrículas de imóveis não obedecendo o rito legal da questão, que merecia uma apuração mais complexa. Disse que ficou comprovado que o processado solicitou ajuda financeira da servidora sob o argumento de “que teria que arcar com tratamento médico de sua noiva, grávida de cinco meses”. “Tal solicitação ilegal, foi de tal forma ameaçadora, argumentando que teria poderes de arquivar processos sigilosos existentes em trâmites nessa Corregedoria, ainda destacando que a mesma teria condições de lhe ajudar, pois seu cônjuge possuía condições financeiras e material para tanto”, narra a desembargadora. Ainda segundo ela, o próprio juiz produziu provas contra si mesmo, ao apresentar mensagens de celular enviados para o celular da servidora Ieda Lessa. Segundo a desembargadora, a mensagem traz o seguinte texto: “Inventei a história de uma noiva que estava perdendo um filho e você caiu”. O juiz aposentado apresentou denúncias contra a servidora na Corregedoria do TJ, por atos ilegais ao cumprimento de seus deveres funcionais no cartório de registro de imóveis. O sindicado ainda determinou a quebra de sigilo bancário de uma pessoa, suposto laranja da servidora. “É evidente a utilização de poderes como magistrados para ameaçar e violar a intimidade das pessoas, praticando atos desprovidos de legitimidade”, pontuou a relatora.

Como retaliação à servidora, que não teria cumprido as ordens de cancelar matriculas de imóveis, o juiz, segundo a relatora, abriu uma representação contra ela na Corregedoria. Em seu depoimento, a oficiala de Justiça afirmou que em maio de 2011 recebeu um oficio do juiz para trancar a matricula de um imóvel. Diante da certidão, a servidora fez o trancamento, mas anteriormente, ela não teria cumprido a ordem, pois a matrícula não estava em Coribe. Ela também recebeu ordens para abrir matrículas diversas e informou que os números informados já existiam e um estava cancelado. Apesar das irregularidades, ela cumpriu a ordem de Sérgio Heathrow. No início do mês de junho daquele ano, Ieda recebeu uma ligação do juiz dizendo que a polícia e o delegado estavam atrás dele, e que ela seria exonerada e começou a ser ameaçada pelo magistrado. Sérgio chegou a afastá-la das funções, designando outra servidora para atuar em seu lugar. Ieda também disse que o juiz disse que o carro de sua família valia mais de R$ 150 mil, e que queria ajuda financeira, e que, em contrapartida, mandaria arquivar os processos contra ela, e que sabia que em Coribe havia os cartórios de registros de imóveis mais rentáveis da Bahia. Sérgio ainda pediu que ela conversasse com o marido, Jonas Jamil, empresário, para pedir alguma quantia para ele.  Sérgio ainda teria afirmado que ajudaria o marido de Ieda em um processo que tramitava na Justiça Eleitoral. O juiz também pediu ajuda a Alex Silveira Ledo, então secretário de obras do município. Todas as testemunhas contaram a história de que o dinheiro era para ajudar a noiva do juiz, que estaria grávida. Na sua oitiva, Sérgio Heathrow afirmou que inventou a história da noiva grávida em Brasília para “verificar a corruptibilidade” da servidora, e que a história da doença e risco de perder o bebê tocaria Ieda. Disse ainda que fez tal ato para verificar casos de corrupção na região. “O processado, ao confessar que tinha inventado a história para verificar a conduta corrupta da oficiala, produziu provas contra si, ao fazer juntadas trechos de mensagens enviadas pelo celular da oficiala Ieda e seu marido Jamil. Aliás, é necessário salientar que esse método utilizado, se fosse o caso de aceitar sua versão dos fatos, não se mostra condizente com a conduta de um magistrado no exercício de sua função. Também é relevante afirmar que o magistrado incorreu em erro ao solicitar ajuda financeira a uma servidora pertencente ao quadro funcional em que atuava como juiz, utilizando-se ainda de conduta extremamente reprovada, de cunho ameaçador”, relatou a desembargadora.

O advogado do magistrado processado, João Daniel Jacobina, durante a sessão plenária, afirmou que Sérgio Heathrow não pediu nenhuma importância à servidora para proferir uma decisão ou deixar de dar uma sentença. “Não há um entrelaçamento entre a solicitação da vantagem e um ato de ofício a ser praticado pelo funcionário, daí porque, em tese, a defesa sustenta que não se trata de corrupção”. “Seja como for, o que tem nos autos, exclusivamente, de consistente, é o depoimento da senhora Ieda, aquela que seria destinatária da solicitação de vantagem indevida. Essa situação surge após o magistrado anunciar que a removeria do cartório de registro de imóveis”, afirma o advogado. A defesa sustentou que a atitude da servidora foi uma retaliação por poder ser removida do posto. Também afirmou que não houve provas sólidas “aptas a justificar uma condenação grave como essa”. “Pode ter havido indícios que justificaram a sindicância, abertura de um PAD [Processo Administrativo Disciplinar], mas a instrução do PAD não trouxe qualquer elemento probatório que dessa musculatura, tonicidade, a acusação, porque, neste particular, a defesa tenta a insuficiência de provas para a acusação”, pontua. Sobre a acusação de cancelamento de matrículas de imóveis, disse que a via para se discutir isso era através de recursos. “Não há acusação de que o magistrado tenha determinado o cancelamento de matrícula ou proferido decisão de usucapião para atender qualquer interesse particular ou para satisfazer interesse seu”, assevera. Também indicou que a Lei Orgânica da Magistratura (Lomam) garante imunidade aos magistrados por suas decisões. “Por mais teratológica que seja a decisão do magistrado, a via mais adequada para questionar a decisão é a via recursal. Não há crime de hermenêutica. Se o magistrado não teve a sapiência jurídica para saber que não se deferi liminar em ação de usucapião, que haja o recurso cabível, que haja a segunda instancia, reforma e decisão”, afirma.  A defesa ainda alegou perda de objeto, pois o juiz já está aposentado por outro processo disciplinar, e que não tem lógica aposentar quem já está nesta condição, e que a pena não teria sentido e efetividade. Também afirmou que o processado não foi intimado, o que foi negado pelos desembargadores, pois o magistrado foi intimado pelo Diário da Justiça Eletrônico, e que foi obedecido todos os tramites legais. Sergio Heathrow já sofreu a pena de disponibilidade e aposentadoria (clique aqui e leia). Esta é a terceira penalização do magistrado, que também é alvo de uma investigação pelo Ministério Público da Bahia (MP-BA) por falso sequestro (clique aqui e leia). A corregedora das Comarcas do Interior ainda pediu que o MP avalie se deve mover uma ação contra o juiz diante das provas coletadas na instrução do processo.

Fonte Cláudia Cardozo


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